‘Ultraman: A Ascensão’ não decepciona e acerta ao fugir da nostalgia

Ultraman virou babá no novo filme da Netflix | Divulgação: Netflix/Tsuburaya/Industrial Light & Magic

Confesso que fiquei receoso quando a Netflix anunciou uma nova animação em CG (computação gráfica) de Ultraman, lá em maio de 2021. De lá pra cá, nutri esta desconfiança com a nova produção devido ao visual dos personagens, principalmente do nosso herói gigante – esperava algo pior do que o Ultraman Zearth (filme de 1996).

Minha experiência em produções de conteúdo me ensinou a não julgar o livro pela capa, sempre esperando o conteúdo antes de qualquer veredito. O resultado pode ser negativo ou positivo. E esta última opção foi o caso do filme Ultraman: A Ascensão (Ultraman: Rising), que estreou mundialmente em 14 de junho pela mesma plataforma de streaming.

Sim, o visual da animação dirigida por Shannon Tindle pode, num primeiro momento, causar estranheza para os fãs mais velhos. O público-alvo é justamente as crianças, que se identificam com filmes como Coraline e o Mundo Secreto e Kubo e as Cordas Mágicas (ambos dirigidos por Tindle).

Não que um adulto não possa ver Ultraman: A Ascensão. Muito pelo contrário, o enredo é feito para toda a família.

Durante uma partida de beisebol, o Ken Sato presencia um ataque de um kaiju | Divulgação: Netflix/Tsuburaya/Industrial Light & Magic

A Ascensão conta a saga de Ken Sato, um bem-sucedido jogador de beisebol, que é egoísta e tenta conciliar sua carreira com sua identidade secreta: ele é o Ultraman. Ken é filho de um casal que tem um histórico de décadas relacionado ao gigante prateado.

Tanto como jogador quanto como herói, Ken conta com o auxílio de Mina, uma inteligência artificial que possui a mesma voz de sua mãe. Um dia, durante uma luta contra um kaiju, o Ultraman (que nesta versão tem a capacidade de se comunicar com os humanos quando transformado) acaba adotando um filho de monstro.

Com isso, a vida de Ken muda completamente e ele tem que se virar para cuidar do bebê kaiju e jogar beisebol. Só que cuidar de um “pequeno” monstro pode ser um problema gigantesco (sem trocadilho), que envolve desde a criação do monstro até o fato de a criatura ser procurada pela FDK (KDF, no original; sigla de Kaiju Defense Force).

Mais familiar, menos nostalgia

Os uniformes da FDK são bem familiares, não é mesmo? | Divulgação: Netflix/Tsuburaya/Industrial Light & Magic

É bom frisar que A Ascensão é um filme com enredo independente e não tem ligação com as séries de TV. Tampouco tem o compromisso de explicar como Ken se tornou Ultraman.

Mesmo assim, o filme procura respeitar o legado deixado por Eiji Tsubuarya, seja citando nomes de monstros ou criando referências para a série original de 1966 e também a Ultraseven, especialmente pelos uniformes dos integrantes da FDK, que são semelhantes aos do Esquadrão Ultra.

Se você for um bom observador, vai encontrar outras referências ao filme A Guerra dos Monstros (filme da franquia Godzilla, de 1965), Abaranger/Power Rangers Dino Trovão (de 2003 e 2004, respectivamente) e até no clássico Kramer vs. Kramer (filme de 1979 estrelado por Dustin Hoffman e Meryl Streep).

A Ascensão não é simplesmente sobre um herói gigante (ou nem tanto assim, se observarmos melhor) que enfrenta monstros causadores de catástrofes na cidade. Proteger a paz e a humanidade nunca deixará de ser importante, mas todo herói tem seus desafios e a do Ultraman foi de cuidar de outra vida.

Ultraman tenta impedir as travessuras do “pequeno” kaiju | Divulgação: Netflix/Tsuburaya/Industrial Light & Magic

Expressar os “ideais de Ultraman” e das relações entre pais e filhos era uma das propostas de Tindle para o filme, com um apelo mais emocional do que na própria nostalgia. E isso fez toda a diferença para A Ascensão, que ressalta a importância de buscar soluções para conflitos familiares, por mais difíceis que sejam.

A versão brasileira, realizada pelo MGE Studios, também teve um cuidado ao respeitar as pronúncias corretas dos nomes dos personagens. Como referência/homenagem, Eduardo Borgerth, dublador de Ultraman Tiga, emprestou sua voz para um comentarista esportivo.

E só pra citar, outro destaque da dublagem fica para o veterano Tatá Guarnieri – dublador de Metalder e de Kenshin Himura em Samurai X – como o pai de Ken.

Ultraman: A Ascensão foge de alguns padrões da franquia, mas é agradável e valoriza a importância da família. O filme não decepciona e não deixa de ser uma forma de divulgar Ultraman para todas as idades.

Bônus: quando Ulltraman salvou um projeto cancelado

Arte conceitual de Made in Japan, um antigo projeto de Tindle | Divulgação

Em 2001, Tindle tinha um projeto chamado Made in Japan, que não seria baseado em Ultraman, mas que teve inspiração na franquia da Tsuburaya (antes a inspiração seria nas séries Super Sentai) e também na sua experiência como pai.

Made in Japan contaria a história de um super-herói criando um bebê monstro. Tindle criou sua arte conceitual para apresentar o projeto ao Cartoon Network. Porém, a produção do canal pago não aprovou.

Em 2015, Tindle apresentou o conceito de Made in Japan para a Sony. O filme passou a ter uma fase de planejamento e, inicialmente, o design permaneceu e seria sobre “um bilionário forçado a crescer quando assume os filhos órfãos de seu antigo inimigo”. Só que o projeto foi cancelado mais uma vez, após três anos na geladeira.

O projeto ganhou mais uma chance em 2019, desta vez com a Netflix, que sugeriu a Tindle transformar seu projeto em um filme do Ultraman. A ideia foi apresentada à Tsuburaya, que aprovou e ainda convidou Tindle para um jantar durante a Tsuburaya Convention daquele mesmo ano.

Ultraman salva o dia e o bebê kaiju | Divulgação: Netflix/Tsuburaya/Industrial Light & Magic

Ainda sem nome oficial, Ultraman: A Ascensão foi anunciado em 14 de maio de 2021, com Tindle atuando também como co-roteirista, junto com Marc Haimes. O plano era incluir uma mistura de astros do Japão e do Ocidente.

Infelizmente, a dublagem japonesa do filme não está disponível no Brasil, mas vale destacar as participações do ator Yuki Yamada (Gokai Blue em Gokaiger e Shiro Mizushima em Godzilla Minus One) como Ken e da veterana Hiroko Sakurai (Yuriko Edogawa em Ultra Q e Akiko em Ultraman) como a mãe de Ami.

Hoje, a parceria entre Tindle e a Netflix está rendendo frutos com a recepção positiva da crítica e do público. Resta sabermos se haverá uma continuação.


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