
O sucesso da primeira temporada de Mighty Morphin Power Rangers, exibida nos EUA entre 1993 e 1994, foi um marco para a cultura pop, em geral, especialmente para o gênero tokusatsu. Sem perder tempo, a Saban resolveu lançar, em 3 de setembro de 1994, o clássico trash VR Troopers, outra série nipo-americana que reaproveitava cenas de ação de séries originais da japonesa Toei Company. Só que desta vez, adaptando produções que haviam praticamente acabado de passar no Brasil.
No ar desde 28 de agosto de 1993, Power Rangers inicialmente teria apenas 40 episódios, adaptando boa parte das cenas de ação de Kyoryu Sentai Zyuranger, série Super Sentai de 1992. Com o estoque das cenas japonesas chegando ao fim, a Saban já se planejava para lançar Psycon.
O protagonista seria Adam Steele, que se fundiria com o ciborgue Psycon em vez de se transformar nele. Seu arqui-inimigo seria Grimlord, cujo alter ego era Cyrus Ritker, que lideraria um exército de robôs conhecido como Cyberdrones. Cyrus teria um filho chamado Percy, rival de Adam nas artes marciais. O mentor e zelador de Adam seria um sensei de artes marciais chamado Tao. Adam seria amigo da filha de Tao, Mia, e de um garoto chamado Mouse MacKenzie.

A Saban resolveu mudar alguns elementos, inclusive o nome; de Psycon para Cybertron. Com previsão de lançamento para dezembro de 1993, Cybertron seria estrelado pelo saudoso Jason David Frank, que já fazia sucesso como Tommy, o Ranger Verde em Power Rangers. Ele interpretaria Adam Steele, que entraria em ação nas cenas japonesas de Metalder (1987; exibido no Brasil entre 1990 e 1991 pela Bandeirantes). Adam enfrentaria um exército de robôs chamados Wardrones, liderados por Grimlord. As características do alter ego de Grimlord (a versão americana do Imperador Neroz) e de seu filho Percy foram mantidas no então novo projeto. O mesmo também para Tao e sua filha Mia.
Cybertron teve apenas o episódio piloto gravado e já mostrava o ator Gardner Baldwin (in memoriam) como Cyrus Rikter/Grimlord, Richard Rabago (in memoriam) como Tao. Douglas Sloan, produtor/roteirista/diretor/ator em várias produções de tokusatsu da antiga Saban, apareceu nas cenas de flashback como Tyler Steele, o pai de Adam. O piloto ainda incluiria uma dupla de repórteres atrapalhados chamados Elmo e Scuzzy (uma tentativa descarada de recriar Bulk & Skull). Inclusive, Elmo seria interpretado pelo comediante Jamie Kennedy (que interpretaria mais tarde Randy Meeks na série de filmes de terror Pânico).
E o tema de Cybertron, interpretado pelo grande Ron Wasserman, era uma versão com uma pegada de rock and roll e que logo seria adaptada como Go Green Ranger Go, em Power Rangers.
Só pelo fato do nome Cybertron ser o homônimo do planeta natal dos Transformers, a Saban resolveu não utilizar mais esse título para não ter problemas com direitos autorais pela frente com a Hasbro — ironicamente, a atual dona de Power Rangers. Daí outra mudança de nome do projeto, desta vez para o famigerado VR Troopers, que adaptou não apenas Metalder, mas também Spielvan (1986; exibida no Brasil entre 1991 e 1992 pela extinta Manchete, com a alcunha de “Jaspion 2”).
Alguns personagens de Cybertron foram mantidos, como foi o caso de Tao Chong, que seria apenas um mestre de artes marciais sem conhecimento de algum segredo sobre a origem de um super-herói. Rabago continuaria no papel. Alter ego de Grimlord, Cyrus Rikter mudou de nome para Karl Ziktor e seria interpretado mais uma vez por Baldwin. Já Percy, não seria mais filho de Rikter/Ziktor e seria apenas um fotógrafo palerma que fazia tentativas fracassadas para descobrir a verdadeira identidade dos Troopers.
Com a volta de David Frank em Power Rangers — que ganhou mais episódios para a primeira temporada, o herói principal Adam Steele mudou de nome para Ryan Steele, interpretado pelo loiro Brad Hawkins. Os outros dois heróis eram J.B. Reese e Kaitlin Star (versões americanas de Spielvan e Diana), interpretados por Michael Hollander (creditado como Michael Bacon) e Sarah Brown, respectivamente.
“Somos realidade virtual!”

Na trama de VR Troopers, o bilionário Ziktor é dono de uma grande indústria. Mas além de se enriquecer com trabalhos ilícitos, ele é, na verdade, Grimlord, o tirano da realidade virtual. Junto com seu exército, Grimlord pretende conquistar a nossa realidade. Dentre os seus inúmeros vassalos, o General Ivan e o Coronel Icebot (General Deslock e Dr. Bio em Spielvan) eram seus principais aliados.
Para deter Grimlord, o Professor Hart, que se comunica virtualmente, escolhe três jovens caratecas para enfrentarem esta ameaça. Ao erguer os medalhões Virtua Laser, eles se transformam nos Troopers, os heróis da realidade virtual. Somente o Professor Hart e também Jeb, o cão falante, sabem da identidade secreta dos Troopers.
O líder do trio é Ryan Steele, instrutor da academia Tao Dojo. Ryan busca o paradeiro de seu pai, desaparecido 10 anos antes do início da série. Como um Trooper, Ryan pode energizar o seu braço para desferir um ataque especial, dar chutes de grande força, além de possuir um computador especial capaz de analisar o ponto fraco de seus adversários, durante as batalhas.
Cérebro da equipe, J.B. Reese utiliza um arsenal como pistola de raios e uma espada que se converte em uma lança laser que destrói os seus inimigos. Seu cinto possui um sistema que teletransporta ele e seus inimigos para outro local de batalha. J.B. comanda a nave-mãe Skybase e a converte em um canhão laser de alta potência.

E Kaitlin Star é a única garota do time. Ela é uma repórter que está sempre a serviço de seu editor-chefe, o destrambelhado Wood. Ela possui uma pistola laser similar ao de J.B.. Sempre que seu parceiro de luta está enfraquecido, Kaitlin transfere parte de sua energia para fortalecer J.B.. Ambos podem combinar os poderes de suas pistolas lasers para aumentar seus ataques.
No meio da primeira temporada, Dark Heart (Top Gunder em Metalder), um dos membros da tropa de Grimlord, foi considerado como desertor. Mas logo descobrimos que ele é, na verdade, Tyler, o pai de Ryan, que foi transformado em um guerreiro do mal. Há também um curioso arco de episódios onde uma amiga dos Troopers foi transformada em Red Python (Herbaira em Spielvan).
A primeira temporada de VR Troopers rendeu 52 episódios e seu sucesso garantiu uma segunda, com mais 40 episódios. O estoque das cenas de ação japonesas de Metalder acabou ainda nos primeiros episódios desta remessa, mas o terreno já estava preparado para uma nova adaptação. É nesta temporada que a produção passou a reaproveitar as cenas de ação de Shaider (1984).
Assim, Ryan passou a vestir o traje azul do Policial do Espaço, sendo então sua nova tecnologia de combate contra Grimlord, que agora passou a ter uma nova forma — com dois chifres e um rabo — e contando com ajuda de novos guerreiros do mal como Oraclon (Kubilai), Doom Master (Comandante Hessler), a estrategista Despera (Sacerdotisa Paul) e as Vixens (Quinteto Kunoichi).

Só pra citar: a segunda temporada de VR Troopers apresentou alguns inimigos humanoides como Arachnobot (Himley em Shaider), Desponda (Rainha Pandora em Spielvan), a irmã de Despera, e Knighttime (Fantasman em Spielvan).
Após 92 episódio, VR Troopers foi cancelada, chegando ao fim em 21 de fevereiro de 1996. O motivo principal foi a escassez das cenas japonesas. A Saban resolveu investir numa nova adaptação intitulada Big Bad Beetleborgs, a versão americana de Juukou B-Fighter, série Metal Hero de 1995 — que foi cancelada também pelo mesmo motivo. Em outras palavras, ficamos sem saber como terminaria a luta dos heróis metálicos contra Grimlord. Mas foi melhor assim.
VR Troopers é uma série que teve vários erros de edição que poderiam ser listados em outro post. Pra se ter uma ideia, Satoru Kiita, personagem de Metalder, apareceu de repente (e sem contexto algum) num episódio onde Ryan lutava contra um vassalo de Grimlord. Outra cena foi quando Lady Hellen, personagem de Spielvan, aparece numa cena de ação durante a primeira temporada, antes mesmo da Kaitlin adquirir o poder de se duplicar.
Mas nada supera a cena americana onde os Troopers erguem as mãos e o cinturão da armadura do J.B. abre sozinho. 😛
Zoando na TV
No Brasil, VR Troopers estreou no antigo canal Fox (atual Star Channel) em 4 de setembro de 1995. Logo depois, na Globo em 18 de setembro do mesmo ano, junto com a segunda temporada de Power Rangers — ambas atrações do extinto programa infantil TV Colosso. Nem preciso dizer que a série causou estranheza em parte do público infantil da época, que já conhecia as séries Metal Hero exibidas na TV brasileira.

O lançamento de VR Troopers fez com que o licenciador brasileiro Toshihiko Egashira, dono da extinta Tikara Filmes, cedesse os direitos de Spielvan e Metalder para a antiga Saban. O mesmo também aconteceu, certamente, com a Globo, que tinha os direitos de Shaider. Curiosamente, as últimas exibições de Shaider na Globo foram nas madrugadas, entre 1992 e 1993. Já a exibição da segunda de Troopers (com as cenas de ação de Shaider) na Globo também aconteceu nas madrugadas, entre 1998 e 1999.
Apesar dos pesares, a série americana contou com a dublagem marcante da extinta Herbert Richers, com direção de José Santana, que emprestou sua voz para Grimlord. Destaques para Marcus Jardym (Ken em Bicrossers e Wes/Ranger Vermelho em Power Rangers Força do Tempo) como Ryan, Marco Ribero (Takeshi Ichijoji em Gavan e Yusuke Urameshi em Yu Yu Hakusho) como J.B., Adriana Torres (Dana/Ranger Rosa em Power Rangers – O Resgate) como Kaitlin, Carlos Seidl (Dr. Gori em Spectreman e Elgar em Power Rangers Turbo) como Tao e o saudoso Orlando Drummond (Galactor em G-Force) como Jeb.
Entre 2012 e 2021, VR Troopers ficou disponível no catálogo brasileiro da Netflix, com a redublagem da Gemini Midia, e com outro elenco da dublagem carioca. Atualmente, os direitos de Shaider, Spielvan e Metalder no Ocidente pertencem à Hasbro, de maneira vitalícia. Estes clássicos são licenciáveis, mas para que alguma delas retorne ao Brasil, alguma distribuidora teria que negociar diretamente com a Hasbro, o que sairia bem mais caro do que negociar com a própria Toei.
Para o bem ou para o mal, VR Troopers será lembrado como uma das piores adaptações americanas de tokusatsu, que está muito aquém da qualidade dos roteiros das séries originais. Mas quem nunca assistiu à série na época só pra matar a saudade dos heróis japoneses, não é mesmo?
Se você tiver bom humor e disposição para ver a série depois de tanto tempo, com certeza você vai rir das trapalhadas que a série acabou se tornando involuntariamente. É tosco? Sim, mas é divertido de tão constrangedor.